
A inteligência artificial (IA) tem se tornado uma ferramenta presente em diversas áreas do nosso cotidiano, e na educação não seria diferente. Para professores do ensino básico, entender o impacto da IA no dia a dia dos estudantes é crucial para orientar o uso dessa tecnologia de forma consciente e produtiva. Afinal, como a IA está transformando a maneira como os jovens aprendem e quais são os desafios e oportunidades que ela apresenta para o ambiente escolar? É o que vamos explorar neste texto.
A IA no cotidiano dos adolescentes: entre a curiosidade e a falta de regras
Uma pesquisa recente, conduzida por Gillian Hayes e Candice L. Odgers da Universidade da Califórnia, Irvine, em parceria com a foundry10, revelou dados importantes sobre o uso da IA entre adolescentes, pais e educadores. O estudo, que envolveu mais de 1.500 adolescentes, indicou que a maioria deles utiliza a IA principalmente através de buscadores, e não de chatbots como o ChatGPT. Surpreendentemente, apenas cerca de 7% dos jovens usam IA diariamente.
O que mais chamou a atenção dos pesquisadores foi a “bússola moral” dos adolescentes. Muitos deles demonstram preocupação com o uso ético da IA, especialmente no contexto escolar, mas sentem falta de orientações claras sobre o que é aceitável ou não. Essa ambiguidade gera dilemas: por que usar uma ferramenta como o Grammarly para revisar um texto seria diferente de pedir a um colega para revisar? Para a maioria dos jovens, trapacear é errado, mas a linha entre o que é trapaça e o que é uma ferramenta de apoio com IA ainda é muito tênue.
O lado B da IA: menor aprendizado e dependência cognitiva
Se por um lado a IA oferece agilidade, por outro, estudos recentes levantam um alerta importante sobre seus possíveis custos cognitivos. Uma pesquisa da Wharton School, da Universidade da Pensilvânia, com mais de 4.500 participantes, mostrou que quem usa IA generativa para pesquisar e produzir conteúdo pode ter um entendimento menos aprofundado do assunto e gerar respostas menos originais e detalhadas em comparação com quem usa buscadores tradicionais como o Google.
A diferença, segundo os pesquisadores, não está na qualidade da informação, mas na forma como ela é apresentada. Textos resumidos, típicos da IA, podem gerar uma passividade que prejudica a aprendizagem ativa, um fenômeno que alguns chamam de “Efeito Google sob esteroides”. Isso significa que, ao saber que a informação está facilmente disponível, as pessoas tendem a memorizar menos e a se esforçar menos no processo de compreensão.
Outro estudo, ainda preliminar, do MIT, que utilizou eletroencefalogramas em 54 participantes, também apontou para um menor engajamento neural e menor recordação do conteúdo escrito entre os usuários de IA. Ou seja, embora as ferramentas de IA possam fornecer respostas corretas, o processo de aprendizagem em si pode ser comprometido, gerando o que os pesquisadores chamam de “dívida cognitiva”.
Como os professores podem orientar o uso da IA em sala de aula?
Diante desses desafios, a proibição total da IA não parece ser a melhor saída. Pelo contrário, é fundamental que as escolas e os educadores encontrem maneiras de ensinar aos alunos o uso seguro e eficaz dessas ferramentas, preparando-os para um futuro onde a IA será cada vez mais presente.
Algumas estratégias que podem ser consideradas incluem:
- Estabelecer regras claras: Escolas e distritos podem criar políticas transparentes sobre o uso da IA, talvez com um sistema de cores (verde para usos permitidos, amarelo para áreas cinzentas e vermelho para usos inadequados).
- Promover o diálogo: Sessões de escuta com pais e alunos podem ajudar a construir um entendimento comum sobre como discutir e navegar o uso da IA em casa e na escola.
- Foco no aprendizado ativo: É importante que os professores continuem a valorizar e incentivar o pensamento crítico, a originalidade e a capacidade de síntese dos alunos, mesmo com o apoio da IA. Avaliações que exijam a compreensão aprofundada do conteúdo, como exames orais, podem ser uma alternativa interessante.
- Ensinar a IA como ferramenta: Em vez de ver a IA como um substituto para o raciocínio humano, ela pode ser ensinada como uma ferramenta para brainstorming, revisão ou para gerar contrapontos a uma ideia.
A inteligência artificial é uma realidade, e os adolescentes são os pioneiros em seu uso. Ao invés de ignorar ou proibir, o caminho é educar e orientar para que a IA seja uma aliada no processo de ensino-aprendizagem, e não um obstáculo.
Referências:
[1] Hicks, M. (2025, 13 de junho). AI Is Still an Unknown Country — and Teens Are Its Pioneers. EdSurge. Disponível em: https://www.edsurge.com/news/2025-06-13-ai-is-still-an-unknown-country-and-teens-are-its-pioneers
[2] Kosmyna, N., Hauptmann, E., Yuan, Y. T., Situ, J., Liao, X.-H., Beresnitzky, A. V., Braunstein, I., & Maes, P. (2025). Your Brain on ChatGPT: Accumulation of Cognitive Debt when Using an AI Assistant for Essay Writing Task. arXiv. Disponível em: https://arxiv.org/abs/2506.08872
[3] Sampaio, H. (2025, 27 de junho). Pesquisa mostra que usar ChatGPT leva a menor aprendizado do que buscar no Google. Terra. Disponível em: https://www.terra.com.br/byte/pesquisa-mostra-que-usar-chatgpt-leva-a-menor-aprendizado-do-que-buscar-no-google,8529c0d72f35ef10b7577842ac6a7dd1cq1umgww.html